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Feminismo e a luta antimanicomial: movimentos de resistência que se entrelaçam
8 de março de 2024
No início do século XX, em meio aos primeiros passos do movimento feminista e as conquistas das mulheres no acesso à educação e à participação política, surgiram diferentes tentativas de repressão para controlar uma suposta “crise da família” e manter uma “ordem social”. Para isso, um dos mecanismos de controle utilizado era o poder manicomial.
Comportamentos considerados desviantes, como o espírito independente, a recusa em obedecer ao pai, a decisão de separar-se do marido ou simplesmente o desejo de escrever livros e trabalhar arduamente, eram rotulados como patologias, merecedoras de confinamento em manicômios.
Nos registros dos manicômios brasileiros, esses traços de rebeldia eram repetidos como indícios de uma anormalidade individual, ignorando-se completamente o contexto social em transformação. Enquanto o movimento feminista lutava por direitos e reconhecimento, a sociedade via com desconfiança essa revolução feminina, interpretando-a como uma ameaça à lógica estabelecida.
O controle sobre esses comportamentos encontrava na estrutura manicomial um instrumento poderoso. A normalização através da psiquiatria servia não apenas para suprimir a expressão feminina, mas também para consolidar o domínio de certos grupos sobre outros na sociedade. Era uma forma de controlar as mulheres que se recusavam a se conformar com os papeis tradicionais.
A decisão de internar uma mulher em um manicômio, muitas vezes, não estava ligada a um diagnóstico preciso, mas sim aos interesses dos seus familiares, especialmente do pai, marido ou irmão. O discurso médico era frequentemente contaminado por juízos morais, substituindo categorias clínicas por preconceitos de gênero.
No entanto, ao longo do tempo, as mulheres começaram a se organizar e a resistir. O movimento antimanicomial encontrou aliadas poderosas que, saindo do espaço privado, assumiram um papel central na luta por uma transformação na abordagem da saúde mental.
Hoje, vemos a participação maciça das mulheres nesse movimento, seja nas organizações de usuários e familiares ou em outras iniciativas políticas, culturais e sociais. Elas não apenas buscam a emancipação das “loucas”, mas também lutam por uma sociedade onde cada indivíduo possa ser reconhecido em sua plena humanidade, livre das amarras dos estereótipos de gênero e das normas opressivas.
A luta antimanicomial tornou-se, assim, parte integrante da luta feminista, na busca por uma transformação radical e verdadeiramente libertadora.